quinta-feira, 31 de março de 2011

Copa Baja SAE Brasil: Laboratório real

* Texto e fotos de Diogo de Oliveira, retirados do site CarSale *
 
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Equipe Cwbaja - 1º Lugar na prova de Tração
 
Sabe aquele prêmio que todo mundo quer ganhar? Agora reduza o horizonte ao universo dos estudantes de engenharia. Bingo! Essa “taça” se chama Baja SAE Brasil (Sociedade dos Engenheiros da Mobilidade). Desde 1995, a competição é realizada no País pela associação. E dentro do mais fino molde “mecânico”, seguindo padrões internacionais – foi inspirada no SAE Midwest Baja Competition, campeonato que reúne alunos norte-americanos e canadenses. Universitários dos quatro cantos do Brasil levam anualmente seus carros (monopostos) até Piracicaba, interior de São Paulo, para uma severa bateria de provas. E para muitos, não é fácil chegar lá.

Nesta 17ª edição do Baja SAE Brasil-Petrobrás, realizada no último fim de semana (e sob sol escaldante), 67 equipes levaram seus veículos ao Esporte Clube Piracicabano de Automobilismo (ECPA) – local onde tradicionalmente é realizada a competição. Os protótipos são construídos pelos próprios estudantes, dentro das especificações exigidas pela organização. O motor é o mesmo para todos: o bloco Briggs & Stratton monocilíndrico de 305 cc (cilindradas), 23 kg e 10,1 cv de potência. A gaiola tem dimensões pré-determinadas. E só. O restante do monoposto é por conta dos alunos, que passam o ano inteiro desenvolvendo câmbio, chassi, suspensão e freios.



Vida dura e dinheiro contado na maioria das equipes

Longe do glamour das grandes competições do automobilismo, a Copa Baja SAE Brasil é uma verdadeira luta pela sobrevivência. Poucas equipes gozam de bons patrocínios e ajuda financeira por parte das universidades – diversas delas públicas. Ou seja, para participar da competição, muitas vezes é preciso mais que aplicar a teoria na prática. Assim fez a equipe Baajatinga, dos alunos da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), em Juazeiro, no norte da Bahia. O nome foi uma homenagem à caatinga, bioma exclusivamente brasileiro e principal formação vegetal do nordeste brasileiro, onde o clima semi-árido imprime temperaturas desérticas.

Para chegar em Piracicaba, o time baiano – que também tem pernambucanos da vizinha Petrolina – encarou compridos 2,8 mil quilômetros de estrada. Com orçamento limitado, eles foram de ônibus, custo bancado pela Univasf. E não fosse o patrocínio da Radix, empresa carioca de engenharia e software, é bem provável que o “Bodão” (nome dado ao monoposto) nem chegasse ao interior paulista. “Tem bode pra todo lado”, brinca André Luis Nascimento (20 anos), o piloto da equipe Baajatinga. O aluno de engenharia mecânica e os amigos do time tiveram de desembolsar R$ 400 cada um para construir o carro, cujo chassi foi feito com sucata recolhida na faculdade.



Criatividade e necessidades comuns aos automóveis

A edição 2011 da Copa Baja foi apenas a segunda participação da equipe Baajatinga. Mas do ano passado para cá, o time nordestino – assim como outros participantes – teve de aprimorar alguns aspectos do veículo. O principal deles é o peso. Há anos os estudantes tentam tirar alguns quilinhos dos monopostos, para reduzir o consumo e fazer com que o carro ande mais rápido. O Bodão, por exemplo, perdeu cerca de 80 kg – passou de 300 kg para aproximadamente 220 kg. E a redução só não foi maior por falta de recursos. Nas equipes de ponta, como a FEI, o peso bruto do bajinha chega a 150 kg, com aplicação de matérias nobres, como alumínio e fibra de carbono.

Aliás, os dois times do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana) foram os campeões da competição pela sétima vez. A faculdade é a detentora do maior número de títulos, sem contar o tricampeonato mundial – os três primeiros colocados da edição brasileira se classificam para a competição que reúne estudantes de engenharia do mundo inteiro, nos Estados Unidos. Entre os dias 26 e 29 de maio, a equipe campeã Baja 2 (Zaya) e a vice Baja 1 (Dipton) vão até Pittsburg, no Kansas, disputar o torneio ao lado da equipe Poli Ciser Fênix, da Poli-USP (Escola Politécnica da Universidade de São Paulo), terceira colocada geral da Copa Baja 2011.



Sofisticações se unem a um apelo ambiental

Aparentemente, os bajinhas parecem brinquedos fáceis de quebrar. Mas não é bem assim. Para avançar na competição, os monopostos enfrentam provas de aceleração, tração e velocidade máxima, além de um enduro com longas quatro horas de duração – em pista de terra repleta de obstáculos. Claro, como em toda competição de automobilismo, nem todos conseguem completar a prova. Mas há um grande esforço para isso, iniciado meses antes da largada, durante o desenvolvimento do projeto. Os seis melhores carros são selecionados. E os times têm de denfeder os projetos, que estão cada vez mais sofisticados entre as equipes endinheiradas.

Os carros da FEI, por exemplo, possuem sistema de telemetria e até uma tela de LCD no volante para o piloto (são até dois por equipe) conferir informações de bordo, como temperatura do óleo, carga da bateria, velocidade e rotação do motor – os dados também são enviados em tempo real à equipe nos boxes. E o apelo verde ganhou espaço com a instalação de placas de armazenamento de energia solar, que recarregam a bateria para poupar o motor. “As placas só não podem ser muito grandes, já que estamos em processo de redução de peso”, explica Felipe Sarabamdo, da equipe Minerva Baja, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).



Competição com status de vitrine

Os próximos anos prometem ser ainda mais revolucionários para os bajinhas. O time carioca da UFRJ, por exemplo, estuda um sistema de armazenamento de energia para os conjuntos de suspensão, muito exigidos durante o enduro. Outro projeto para o “Biribaja”, apelido dado em homenagem ao incomum sobrenome do integrante Paulo Biriba, é uma coluna de direção feita de fibra de carbono – a atual, de pinhão e cremalheira, foi desenvolvida pela própria equipe. Mas, lógico, quanto mais sofisticado, mais caro o carro fica. O da equipe Minerva Baja da UFRJ, por exemplo, custou cerca de R$ 15 mil, três vezes o valor gasto pelos baianos no Baajatinga (R$ 5 mil).

Mas independente do custo, no fim o que vale é a competição em si e a rede de contatos que ela oferece. “Quem está aqui é porque gosta. Agora, é claro que o Baja é um caminho para ingressar no mercado de trabalho”, observa otimista Francisco Loiola (23 anos), estudante de engenharia mecânica e membro da equipe Baajatinga, que acabou desclassificada na prova de aceleração por causa de uma arruela (foto), pequeno disco furado no meio. A peça quebrou, provocando vazamento de fluido de freio, o que impediu que a equipe participasse das provas seguinte, de obstáculos (off-road) e tração – aqui eles defenderiam o título conquistado na edição 2010 do campeonato.



“Como experiência de vida é o Baja fantástico. O aluno acaba passando mais tempo com a equipe que com a família. E abre mão de festas e feriados. Não é só um desafio de engenharia, mas a convivência e o trabalho em equipe. É um espírito que não se encontra facilmente dentro da indústria ou nas competições de automobilismo, como a Fórmula 1. Ali é um trabalho muito específico, cada um faz a sua parte. Ninguém sabe de tudo. E isso muda esse escopo que eles têm aqui. Eu sempre digo que é a experiência mais completa possível para um engenheiro”, valoriza Rafael Serralvo Neto, ex-bajeiro pela FEI e atual vice-diretor da Copa Baja SAE Brasil.